quarta-feira, 25 de julho de 2007

Os Maias do meu contentamento


“Todo o mundo mais ou menos a falha. Isto é, falha-se sempre na realidade aquela vida que se planeou com a imaginação. Diz-se: «Vou ser assim, porque a beleza está em ser assim.» E nunca se é assim, é-se invariavelmente assado, como dizia o pobre marquês. Às vezes melhor, mas sempre diferente.”

É impressionante como uma simples constatação da vida desiludida consegue resumir toda a genialidade do (provavelmente) maior romance da literatura portuguesa: “Os Maias” de Eça de Queiroz. Constatação que surge no final do livro, à laia de epílogo, depois de resolvidos os episódios da vida romântica vividos por Carlos da Maia e João da Ega.

(Re)ler os Maias foi uma experiência por que todos os portugueses deviam passar. São mais de 700 páginas que se lêem de um fôlego, com sofreguidão, mesmo que se saiba à partida como tudo vai acabar (mal?). É talvez o maior fresco sobre o Portugal novecentista, que nem por isso é assim tão diferente do Portugal de séculos anteriores e posteriores. É o Portugal do fado que nos afoga numa existência pequena e miserabilista, mas ao mesmo tempo com uma alegria e um humor imensos. Porque se há algo que os Maias reflectem é a nossa capacidade de escarnecer e maldizer de nós próprios, mas sempre a cantar. Ou então, a nossa capacidade de auto-crítica e ao mesmo tempo a nossa incapacidade de aceitar as criticas vindas do exterior.

Nos Maias está lá tudo: os pequenos poderes e as grandes amizades, os amores e os desamores, a comédia e o drama da vida quotidiana, arquétipos para todos os gostos. Um épico que se o nosso cinema não fosse também pequeno, já o teríamos em mega-produção e wide-screen. Mas provavelmente é melhor que os Maias não saiam do papel, porque ler o livro e visualizar aquele universo com a imaginação é o melhor filme que se pode ter.

Mas acima de tudo, nos Maias está a nossa língua tratada como tão bem ela merece ser tratada em papel. Estão palavras mágicas que se saboreiam a cada letra. Estão sequências que tornam sonhos em realidade (parece tão fácil...) e de que nas últimas semanas procurei dar conta aqui. Está o romance da nossa portugalidade.

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