quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Uma viagem (muito) curta

Confesso que sou admirador de Paul Auster há muitos anos, desde que há cerca de 15 anos o li pela primeira vez “No País das Últimas Coisas”, quando o senhor ainda era um ilustre desconhecido, ou então ainda não vendia o suficiente para ser aclamado pela crítica, nomeadamente a portuguesa, que sempre o aclamou.

Fiquei desde logo cativado pelas histórias “on the road” cinematográficas, pelos universos paralelos criados, irrealmente reais e profundamente americanos, que se confirmaram em livros que nunca esquecerei, como “A Trilogia de Nova Iorque”, “A Música do Acaso” (este é capaz de ser o meu preferido), “Mr. Vertigo” ou “Leviathan”.

Confesso também que se a costela cinematográfica de Auster sempre me cativou nos seus livros, a transposição para a tela nunca teve o mesmo efeito encantatório: “Lulu On The Bridge” é mesmo muito fraco. Como confesso ainda que o elevar do estatuto do senhor aos píncaros da literatura internacional, assim como a minha dedicação às letras portuguesas na última década, me afastou de Paul Auster. Continuo a lê-lo, é verdade, mas já não com o mesmo entusiasmo e intimismo, e isso reflectiu-se na leitura (demasiado) rápida e fácil do mais recente “Viagens no Scriptorium”.

Este é um livro em que Auster repete as suas fórmulas do costume, como por exemplo a introdução de histórias paralelas dentro da história principal; o fechar kafkiano da personagem principal dentro de um espaço confinado, sem se saber de onde ela vem e para onde vai, sendo que no caso de “Viagens no Scriptorium” esta incerteza mantém-se até ao fim. E quando a coisa começa a pegar, Auster fecha o livro deixando-nos claramente com água na boca. Será que o facto da personagem principal ser supostamente um homem culpado dos mais hediondos crimes justifica a decisão expressa explicitamente pelo autor em deixar a sua personagem principal suspensa, sendo que quem fica suspenso é o leitor e eu, nesse papel, não gosto de ficar suspenso? Será que Auster está à procura de uma abordagem mais experimental? Ou será que já não sabe como acabar uma história? Ou será ainda que “Viagens no Scriptorium” é apenas um livro menor numa obra com alguns maiores muito interessantes?

A minha Carla não gostou mesmo nada, e ela também tem sido uma leitora fiel de Auster. Ficou irritada com a opção do autor: “tanta coisa para nada” disse-me ela. Depois de ler compreendi a reacção dela, mas confesso (e é a última vez que o faço neste texto) que não fiquei irritado. Tentei justificar, a mim e a ela, a opção por aquele fim, mas provavelmente o que estou aqui a fazer é tentar justificar uma relação que de tantos anos e tantos livros que ainda não estou preparado para perder por completo. Pelo menos na esperança de que a próxima viagem de Paul Auster vá mais longe do que esta que se fica pelo scriptorium.

1 comentário:

Vespinha disse...

Senti um pouco o mesmo mas não fiquei irritada... Irritada a sério fiquei com o filme «The inner life of Martin Frost»: http://vespaaabrandar.blogspot.com/2007/10/auster-s-escrever-no-filmar.html

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