segunda-feira, 2 de abril de 2007

Carta aberta a António Lobo Antunes


Meu caro António Lobo Antunes. Antes de mais, muitos parabéns pelo Prémio Camões. Tenho a certeza que o prémio não lhe foi atribuído por politiquices nem por conveniências. Estou mesmo certo que o louvor lhe é inteiramente devido, não só pelo extenso trabalho literário que tem vindo a produzir desde há quase 30 anos, mas também pelo brilhantismo de que se reveste a sua técnica literária, provavelmente demasiado avançada para o nosso tempo. Estou mesmo convicto que muitos dos seus livros, nomeadamente os mais recentes, e os que são (naturalmente) mais do seu agrado pessoal, só serão devidamente compreendidos daqui por alguns anos. Pelo menos estou em crer que é isso que vai acontecer comigo.

O António Lobo Antunes foi um dos autores que me despertou para a genialidade da nossa literatura à beira mar plantada. “Manual dos Inquisidores” está mesmo na minha lista de favoritos pessoais, onde cada capítulo é narrado por uma personagem, que pode ser principal e completamente central ao fluxo da história, ou completamente secundária, ao ponto de tocar apenas nas franjas da narrativa. E a cada capítulo somos confrontados com a aventura de descobrir quem está a falar (ou escrever, dependendo do ponto de vista) e qual é a sua relação maior ou menor com o todo. Tudo isto no contexto de uma família aristocrática durante o Estado Novo torna esta aventura literária ainda mais fascinante (um dia destes vou ter mesmo de reler este livro). Um poder que se sente na sua própria afirmação ao Jornal de Letras em 1996, “não acho o livro magoado. Posso achá-lo violento e cruel, terno, mas magoado não. Houve alturas em que senti que a coisa me sentia como a «Cavalgada das Valquírias», no «Apocalipse Now»”.

Contudo, e porque na vida há sempre um mas, tal como me fascina o “Manual dos Inquisidores!”, também me perco completamente nos seus escritos mais recentes e confesso mesmo que não fui além de “Não Entres tão Depressa Nessa Noite Escura”. E neste caso particular não passei mesmo das 100 páginas. Confesso que fico irritado quando não percebo aquilo que estou a ler. Quem está a falar. O que se está a tratar. Provavelmente sou eu que sou iletrado e incapaz de penetrar a (cada vez maior) complexidade dos seus escritos. Ou provavelmente estes são daqueles livros que precisam de anos para amadurecer no palato dos leitores, como os bons vinhos.

De uma coisa eu tenho a certeza: eu sou daqueles leitores que adora observar e absorver a técnica (e a sua é grande), mas também sou dos que precisa de uma história, ou um fio condutor que seja, ao qual me possa agarrar. Por isso, meu caro António Lobo Antunes, para esta história ficam os meus parabéns ao seu Prémio Camões, quem sabe a antecâmara de um Nobel já há algum tempo anunciado - mas aviso-o, e você já deve saber melhor que ninguém, que este prémio gosta mais de escritores engajados politicamente do que de escritores engajados literariamente, que creio ser o seu caso.

Quanto a este humilde leitor, fica a promessa de que um dia destes volto a tentar ler as suas últimas obras. Só não prometo que vou perceber ou gostar. Mas se o António Lobo Antunes se explicar um bocadinho melhor talvez eu chegue lá.

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